Com quantas caçambas se faz uma casa?
Matéria interessante do jornal O Globo por Flávia Monteiro
O boom da construção civil impôs à paisagem carioca um mobiliário não muito popular entre os moradores, mas imprescindível em qualquer obra: as caçambas usadas para recolher entulho. São toneladas de sobras de cimento, telhas, madeira, gesso, pedras e pisos jogados fora todos os dias. É metade do material desperdiçado numa obra, segundo estimativas.
O Morar Bem fez as contas e chegou à conclusão de que bastariam apenas quatro caçambas cheias para se erguer uma casa padrão, com dois quartos. Elas seriam suficientes para armazenar os 75 sacos de cimento, 2.500 tijolos e 1.200 telhas necessárias, segundo cálculos do engenheiro Antero Jorge Parahyba.
Embora não haja uma estimativa oficial de quantas caçambas estão espalhadas hoje pela cidade – a Comlurb, órgão responsável por ditar as regras, atua apenas na fiscalização – é possível encontrar uma caçamba a cada quilômetro percorrido em bairros como Copacabana, Ipanema e Leblon.
Aluguel aumentou 30% em dois anos
Segundo empresas do ramo, o aluguel do recipiente aumentou 30% nos últimos dois anos. Hoje, o destino final do entulho são três aterros sanitários, mas poderia ser diferente, dizem os especialistas.
– A aplicação mais recomendada é a utilização do entulho para pavimentação. Mas, dependendo da técnica de fundação usada numa construção, é possível usá-lo como brita. Cidades como São Paulo já possuem usinas de reciclagem de entulho, onde ele é separado, triturado e reaproveitado – diz o engenheiro civil e professor da Escola Politécnica da USP, Vanderley John.
Por aqui, algumas empresas de coleta separam o material recolhido. Plásticos e sobras de madeiras são encaminhados para cooperativas de reciclagem. Em fim de obra, diz Fernando dos Santos, da Real Entulho, é mais comum encontrar materiais que podem ser reaproveitados, como vigas de madeira.
Móveis e até colchões também costumam aparecer entre o entulho, diz uma funcionária da Alfa Entulho:
– É comum vizinhos de uma obra se aproveitarem da caçamba, para jogar fora móveis e objetos pessoais.
Como funcionam as coletas
O QUE DIZ A LEI: A coleta, transporte e destinação final do entulho deve ser feita pela Comlurb ou por empresa credenciada por ela.
COLETA PAGA I: É feito por meio do aluguel de caçambas com cinco metros cúbicos de capacidade, o equivalente a 400 sacos de 20 litros. Os preços variam entre R$150 e R$250.
COLETA PAGA II: A remoção deve ser feita 48 horas após a instalação ou oito horas depois de cheias. Quando não há vagas disponíveis (as caçambas são tratadas como veículos), elas podem ocupar a calçada, desde que não atrapalhem o fluxo de pedestres.
COLETA GRATUITA I: A solicitação pode ser feita pelo 2204-9999, de segunda a sábado, das 6h às 22h. É realizada em, no máximo, cinco dias corridos, de segunda a sábado, das 7h às 22h.
GRATUITA II: O entulho deve estar acondicionado em sacos de até 20 litros. São removidos, no máximo, 150 sacos. O limite para telhas ou tijolos inteiros é de 150 unidades. Para bens pesados ou volumosos, como um sofá, a remoção fica limitada a dois itens.
Coleta gratuita é indicada para obras menores, que geram pouco entulho
A dúvida é recorrente entre aqueles que estão construindo ou reformando um imóvel. Vale a pena desembolsar entre R$150 e R$250 para alugar uma caçamba ao invés de optar pelo serviço gratuito de coleta oferecido pela Comlurb? A resposta parece óbvia, mas não é. Alguns fatores devem ser levados em conta, diz o arquiteto Mário Henrique.
– A Comlurb recolhe até 150 sacos de 20 litros e a coleta não é imediata (o atendimento é feito em até cinco dias). Ela é indicada para quem está realizando uma pequena obra em casa e não tem pressa em retirar o entulho. Já as caçambas alugadas têm capacidade para 400 sacos. E são indicadas para obras de grande porte ou novas construções, onde há prazos a serem cumpridos.
Prazo previsto em lei é burlado, diz moradora
Alguns empreiteiros chegam a incluir no orçamento os gastos com o aluguel de caçambas. É um ônus que não chega a pesar no bolso, diz o arquiteto, e livra o cliente da dor de cabeça de ter que se livrar do entulho acumulado.
Ainda que boa parte dos resíduos vá parar nos aterros, iniciativas isoladas mostram que é possível aproveitá-los. Um dos jardins criados para a edição 2010 do Casa Cor São Paulo foi feito apenas com materiais reaproveitados. Os tijolos, conta a arquiteta Sylvia Figueiró, foram produzidos com sobras de terra de obras.
– Esses tijolos foram transportados na própria caçamba até o local que abriga a mostra. Assim como a pedra ecológica usada no piso, que é feita da reciclagem de resíduos da construção civil – diz Sylvia.
Ainda que necessárias para o bom andamento de uma obra, as caçambas geram muita dor de cabeça quando usadas de forma inadequada. Diz a Lei de Limpeza Urbana que elas podem ocupar vagas de estacionamento. Quando não há, podem ficar na calçada, desde que não prejudiquem o fluxo de pedestres. Na prática, não é bem isso que acontece.
– As calçadas ocupadas geralmente são estreitas. Além disso, muitos pedestres usam as caçambas como uma lixeira comum. Acho que falta orientação sobre o uso correto desses recipientes – diz a analista de sistemas Fernanda Carvalho, moradora de Copacabana.
Outro motivo de discórdia é o tempo de permanência das caçambas nas ruas. Na contramão da lei, que estipula a sua remoção 48 horas após a instalação ou oito horas depois de cheias, muitas chegam a ficar até mais de uma semana.
– Há empresas que logo de cara já informam ao cliente que o prazo não é seguido à risca. E dizem que é possível esticá-lo até, mais ou menos, uma semana, conforme a necessidade – conta uma moradora de Botafogo, que está reformando o seu apartamento.
Comlurb pode confiscar caçambas irregulares
O cumprimento das normas fica a cargo da Comlurb, que afirma ter hoje 350 agentes de limpeza responsáveis por fiscalizar as posturas previstas em lei. Ainda de acordo com a companhia, ao notarem alguma irregularidade, os agentes notificam a empresa. Caso o problema não seja solucionado ou a caçamba removida, a Comlurb pode confiscá-la.
A companhia informou ainda que recebe reclamações pelo telefone 2204-9999, que funciona de segunda-feira a sábado, das 6h às 22h.
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